Chuva mansa


A lembrança do seu beijo faz pirraça e aparece na manhã de segunda, no meio do expediente. A ideia de trabalhar até mais tarde se desfaz, as pessoas passam por mim em câmera lenta e no mudo, porque sua presença não deixa espaço pra mais nada nem ninguém. Você, mesmo de longe, transforma meu dia em um filme de comédia romântica meio cult com trilha sonora maravilhosa repleta de música brasileira, daquelas boas que merecem suspiros.

Meu celular vibra no canto da mesa e é você com mensagem provocante às 11 da manhã. Adianto meu horário de almoço e saio com pressa pra te encontrar, me sentindo um adolescente com algumas borboletas no estômago e no coração. Vou direto para a sua casa, o porteiro me anuncia, elevador que demora, ansiedade tomando conta, conversa fiada com a vizinha e finalmente sua porta. 505. Quando penso em tocar a campainha, percebo que já está aberta. 

Entro na sala, seu cheiro denuncia que está no quarto, corro e te vejo, te beijo, te cheiro, te aperto, te sorrio. Você pula em mim, enrosca as pernas no meu quadril de um jeito moleca que nunca vi em outra mulher que já passou dos 30. Me beija dizendo que demorei, te jogo na cama, tiro sua blusa enquanto você já puxa a minha me arranhando. Minha boca procura seu pescoço e seu corpo que está mais quente que meus pensamentos, te atravesso, perco o rumo, me encontro.

Quantas coisas antes de você eu já vivi, quantos amores, quantos encontros, desencontros, certezas desfeitas, paixões loucas. Mas você, com você, é tudo sem filtro, avassalador, sua presença preenche tudo, seu riso corta o trânsito caótico lá fora, a chuva amansa para te ouvir dizer meu nome suado que na sua boca vira poesia, verso, prosa, rima e música. Eu te olho saindo da cama e desacredito desse sentimento todo que me invade. Você me consome, cada canto de mim é completamente seu.

Eu sei que como todo furacão, você vai passar. Vai embora, cedo ou tarde, deixando suas marcas, seus estragos. Sua ida já estava anunciada no momento em que chegou e é sempre tão nítido. Cada encontro nosso tem gosto de primeira vez misturado com despedida, a sensação de não saber se vou te ver de novo mais tarde, amanhã ou nunca mais. Ou semana que vem sendo o furacão de outra pessoa no bar mal pintado lá no centro da cidade. Nada, nada disso me interessa.

Com você sou corajoso, escolhido como sua terra para fazer morada, ainda que breve. Lisonjeado com seus olhares, afetos, palavras, trocas, lambidas, beijos e mordidas. Com você vale a pena, o tempo que for. E se quiser ficar, se desfazer furacão pra virar chuva mansa batendo no meu telhado, eu me acostumo com a calmaria. Porque com você, qualquer garoa é tempestade dentro de mim.

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